Muitas vezes quando nos deparamos com um problema público costumamos dizer que falta vontade política para resolver este problema, mas será que é somente isso? Saiba mais sobre neste artigo!
É muito comum colocarmos a culpa de todos os problemas públicos na conta dos (as) prefeitos (as) de nossas cidades, associando estes problemas a falta de uma “vontade política” para que sejam resolvidos.
Certamente a priorização de determinadas áreas de políticas públicas ou a escolha dos problemas prioritários de uma cidade é de responsabilidade do poder executivo, mas será que eles têm a capacidade de resolver todos os seus problemas?
Metaforicamente, vamos pensar em uma situação na qual uma família deseja construir uma casa. Quais são os recursos necessários para que isso possa ser materializado?
Em síntese, podemos pensar que essa construção vai demandar uma mão de obra especializada em projetar e construir casas, como um arquiteto e pedreiros. E, da perspectiva material, essa construção vai demandar cimento, tijolos, madeira, dentre outras coisas.
A simples vontade dessa família de construir essa casa não é suficiente para que ela se materialize caso esses recursos materiais e humanos não estejam disponíveis.
Resguardadas as devidas proporções, no setor público, não é muito diferente.
Para que o poder público tenha condições de materializar as políticas públicas, de toda a natureza e de todos os setores, ele precisa dispor do que é chamado de capacidades estatais.
Apesar do conceito de capacidades estatais ser muito diverso e mobilizado de diversas formas pela literatura, há um deles que pode nos ser muito apreensível, e que diz que capacidades estatais tratam-se da capacidade do Estado em implementar políticas públicas.
Comumente a literatura aborda este conceito a partir de duas dimensões: a técnica-administrativa e a político-relacional.
Esta dimensão das capacidades estatais diz respeito à dimensão mais objetiva das capacidades estatais e está relacionada, por exemplo, às disposições materiais que o poder público possui para implementar as suas políticas públicas.
Nesta dimensão se inserem variáveis como um corpo burocrático altamente especializado capaz de desenvolver as suas atividades de forma eficaz e eficiente considerando, inclusive, que o corpo de funcionários públicos, os chamados burocratas, são essenciais para que as políticas possam se materializar e gerar resultados para a sociedade.
Mas além destes, podemos incluir também a dimensão financeira, que é essencial para que os recursos materiais possam ser mobilizados e viabilizem a implementação da política garantindo, por exemplo, determinados equipamentos e infraestrutura.
Esta dimensão é menos objetiva pois depende de uma série de interações interpessoais. Basicamente diz respeito às interações entre os atores políticos para viabilizar a concretização das políticas públicas.
A capacidade desses atores de mobilizar capital social para dialogar com outros atores e assim colocar os seus objetivos na mesa para que sejam pautados e potencialmente transformados em políticas públicas denota a dimensão político-relacional das capacidades estatais.
Vamos analisar as políticas de saúde e educação para ilustrar como as capacidades estatais se expressam.
No âmbito da política de saúde, a capacidade técnico-administrativa está relacionada, por exemplo, à disposição de médicos, enfermeiros, leitos de hospital, equipamentos de raio-x, a própria UBS ou hospital, recursos de tecnologia da informação.
Já a dimensão político-relacional se expressa nos conselhos de gestores da saúde, que são espaços onde os atores políticos sentam para dialogar e construir os rumos da política.
No campo da educação, a capacidade técnico-administrativa se expressa, por exemplo, na disposição de professores, diretores, material didático e escolas com os seus respectivos equipamentos.
Já a dimensão político relacional pode se expressar também nos conselhos da educação, onde diversos atores vão interagir e participar da construção da política.
Retomando as questões iniciais deste texto, o que as capacidades estatais nos dizem é que, a despeito das vontades políticas ou da sua ausência, existem certas contingências para que as políticas públicas sejam implementadas, que é a disposição de capacidades estatais. Obviamente os governos também são responsáveis por construir capacidades estatais. No entanto, quando analisamos a capacidade de ação dos governos e a sua capacidade em implementar as políticas públicas, não podemos perder esta dimensão de vista.
Mestrando em Administração Pública e Governo (FGV). Bacharel em Gestão de Políticas Públicas (USP). Desenvolve pesquisas sobre políticas de saúde e educação, desigualdades, federalismo, orçamento público e financiamento de políticas públicas.