Você já ouviu que os gastos públicos são ineficientes? Nesse artigo vamos falar sobre os dilemas da eficiência do gasto público brasileiro.
Você já deve ter ouvido por diversas vezes que o Brasil não gasta pouco com as suas políticas públicas, mas sim que é ineficiente. Mas será que é isso mesmo?
É muito comum a gente ouvir em diversos meios, inclusive de especialistas em determinadas áreas, que o Brasil não gasta pouco com as suas políticas públicas, mas sim que é ineficiente. Mas afinal de contas, o que é eficiência?
Resumidamente, eficiência nada mais é do que a produtividade de determinados resultados a partir de um determinado nível de insumos. Neste sentido, ser eficiente significa produzir o maior nível de resultados possível a partir do menor nível de insumos possível.
Portanto, a mensuração da eficiência do gasto público o utiliza como o insumo que gerará determinados resultados, de modo que uma gestão eficiente vai obter o melhor nível de resultados possível a partir do menor nível de recursos.
No entanto, esta eficiência deve ser entendida de uma perspectiva relacional, ou seja, deve-se perguntar: eficiente em relação a que?
Só é possível compreender a eficiência de uma gestão ou de uma organização a partir de uma referência. Ou seja, só é possível dizer, por exemplo, que um município é eficiente quanto aos seus gastos públicos em relação a outro município.
Neste exemplo, o município com melhor relação entre seus resultados e insumos é o município mais eficiente. Existem técnicas de mensuração que fazem os cálculos precisos sobre os níveis de eficiência de um município ou organização, sendo possível identificar assim qual unidade possui eficiência de 100%, ou seja, eficiência máxima, e qual é a eficiência das outras unidades em relação a eficiência perfeita.
Apesar do cálculo da eficiência ser muito importante para orientar a tomada de decisão na gestão pública com vistas a promoção da eficiência, os seus níveis dependem muito do que está sendo mensurado e da forma pela qual é mensurada.
Por exemplo, a eficiência do gasto público educacional de um conjunto de municípios pode adotar os gastos públicos como insumo e os resultados dos alunos em provas como resultado, e isso vai indicar um determinado nível de eficiência. No entanto, para o mesmo conjunto de municípios um outro cálculo pode adotar o nível de aprovação na escola como resultado, e isso vai gerar um outro nível de eficiência.
Em síntese, o que quero indicar é que a depender dos indicadores que escolhemos para mensurar a eficiência do gasto público, podemos chegar a resultados diferentes de eficiência. Portanto, não basta dizer que tal política ou gestão é eficiente ou ineficiente, mas além disso é preciso qualificar o debate com a exposição das razões pelas quais o fenômeno se observa, para que não se corra o risco de dizer que determinado gasto é desnecessário enquanto ele não é.
Mais do que uma recomendação para a administração pública, a eficiência é um dos seus cinco princípios previstos no artigo 37 da Constituição Federal. Portanto, toda a administração pública tem a obrigação de ser eficiente.
Apesar da eficiência dizer respeito a uma relação entre insumos e resultados, e a sua mensuração não levar em conta precisamente os níveis de recursos que as unidades executoras de recursos possuem à sua disposição para gerar os seus resultados, existem estudos que demonstram que o nível de recursos pode ser um dos determinantes da eficiência do gasto público.
Basicamente isso pode acontecer pois, por exemplo, municípios com maior porte populacional e quantidade de recursos à sua disposição têm melhores condições de terem ganhos de escala nas suas compras e na gestão da máquina pública, reduzindo assim os seus custos e sendo mais propícios a serem eficientes.
Portanto, existe um determinado limiar de recursos abaixo do qual as unidades executoras de recursos (pode ser o município) não possuem condições adequadas de operarem com eficiência.
É muito comum ouvirmos que o problema da educação brasileira não está na quantidade de recursos que alocamos para a educação, mas sim na sua eficiência.
Esta colocação pressupõem que já destinamos uma quantidade de recursos suficientes para educação, e que para melhorar a sua qualidade basta aumentarmos o seu nível de eficiência.
Apesar de precisarmos buscar mecanismos que melhorem a eficiência do gasto público educacional, o Brasil ainda não destina uma quantidade adequada de recursos para educação em comparação com outros países.
Não podemos colocar toda a culpa nos nossos níveis de desempenho escolar na conta da eficiência!
Enquanto o Brasil gastava 3.762 dólares (convertidos pela paridade de poder de compra) na educação infantil e fundamental em 2015, os Estados Unidos gastavam 11.727 dólares, a média dos países da OCDE gastava 8.631 e o Chile gastava 5.064.
Antes de colocarmos a culpa dos nossos resultados em políticas públicas apenas na eficiência dos gastos públicos, precisamos entender primeiro o que é essa eficiência que está sendo tratada e a forma como ela está sendo tratada.
A eficiência é sim um grande desafio para a gestão pública brasileira, mas não se pode perder de vista que a sua interação com outros elementos da gestão pública, como o próprio montante de recursos, também são determinantes dos resultados das nossas políticas.
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Mestrando em Administração Pública e Governo (FGV). Bacharel em Gestão de Políticas Públicas (USP). Desenvolve pesquisas sobre políticas de saúde e educação, desigualdades, federalismo, orçamento público e financiamento de políticas públicas.